Idosos
Simone de Beauvoir aos 70 anos dizia “Não reconhecemos a velhice em nós, nem sequer paramos para observá-la, somente a vemos nos outros, mesmo que estes possuam a mesma idade que nós”.
As condições favoráveis de vida podem propiciar que algumas pessoas envelheçam de forma mais lenta, conservando a aparência jovem por mais tempo.
Há que salientar que a miséria fragiliza os povos e pode provocar desgastes avassaladores (metamorfoses que o tempo urge em tecer) produzidos pela vida e pelo trabalho adverso, em condições precárias (camponeses, pedreiros, entre outras actividades), inutilizando socialmente o “velho” trabalhador, que prematuramente se torna cansado e, consequentemente, excluído.
Existe uma tradição antiga no norte do Japão, foi narrada no filme “The Ballad of Narayama”, em que quando se completa 70 anos de idade, os moradores da vila devem subir até ao topo da montanha local, o Monte Narayama, uma região sagrada e que deveriam esperar pela hora da própria morte, sozinhos. Tratava-se de uma lei colectiva que garantia a sobrevivência do povo local, que era bastante pobre. As pessoas de idade nem sempre ficavam felizes com este costume, porém fazia parte da vida na aldeia e era aprovado por todos – os mais velhos aceitavam o seu destino e subiam o monte em silêncio, onde morriam de fome e em solidão.
Assim, os idosos quando começam a perder os dentes (por volta dos setenta anos) devem deixar a vila, ainda que estejam lúcidos e possam contribuir com trabalho. Os dentes perdidos são uma espécie de sinal de que já não podem contribuir para o próprio sustento, sendo um peso para seus descendentes. Os idosos são levados por um membro da família até Narayama, uma montanha que abriga os restos mortais de diversas gerações de idosos, para perecer e assim deixar espaço na sociedade para um novo membro.
Porém, o Japão, que é um dos países mais envelhecidos do mundo, actualmente procura soluções para a crescente demanda no cuidado dos idosos, um sector que promete ser responsável por uma grande rentabilidade económica no futuro.
REQUIEM POR MIM
Aproxima-se o fim.
E tenho pena de acabar assim,
Em vez de natureza consumada,
Ruína humana.
Inválido do corpo
E tolhido da alma.
Morto em todos os órgãos e sentidos.
Longo foi o caminho e desmedidos
Os sonhos que nele tive.
Mas ninguém vive
Contra as leis do destino.
E o destino não quis
Que eu me cumprisse como porfiei,
E caísse de pé, num desafio.
Rio feliz a ir de encontro ao mar
Desaguar,
E, em largo oceano, eternizar
O seu esplendor torrencial de rio.
Miguel Torga, in 'Diário (1993)'
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